O que se prega nas ruas é: o quanto eu posso tirar de proveito, o quanto eu posso levar de vantagem, o quanto eu posso me dar bem, não importa se isso vai prejudicar alguém. A cultura do possuir, possuir e possuir tomou conta das mentes de tal forma que já não importa mais que todos tenham um pouco, mas o que importa é se eu faço parte dos poucos que possuem.
O grande problema é que as crianças deixadas nas latas do lixo hoje (aquelas que ninguém se importa), daqui a 11, 12 anos (e passam rapidinho) estarão frente a frente conosco. Isso mesmo frente a frente. Talvez seja em um semáforo tentando nos vender uma bala de hortelã ou ameaçando-nos com uma bala de qualquer desses calibres existentes por aí. A questão é que quando se fala em políticas públicas e ações da sociedade no combate à violência se fala sempre no combate armado aos criminosos de hoje (eles são sempre jovens), e quando alguém menciona que a forte razão da violência está intimamente relacionada com a desigualdade social as pessoas geralmente desanimam em pensar que trabalhar na educação e sustento de uma criança hoje produzirão resultados a longo prazo, apenas. Mas que longo prazo? Uma criança de cinco anos hoje, daqui a simples e rápidos 10 anos estará com 15 anos sendo aliciada para trabalho no tráfico de drogas, pelo fato de terem estudado em colégios com péssimo ensino, pelo fato de não terem tido natais, aniversários, roupas, calçados, alimento básico, carinho, família, oportunidades.
Meu Deus!!!! Ah! Se a sociedade entendesse que 10 anos é um curto prazo! Começaria agora a trabalhar e invadir o Rio de Janeiro, o Brasil com um grande movimento de divisão de renda, um verdadeiro choque de educação, moradia, dignidade, oportunidades para TODAS as crianças carentes que ainda são inocentes, e que por “bala”, por enquanto, só conhecem a de hortelã.
Sempre existiram ricos e sempre existirão. Mas por que alguém consentir em “ter tanto” e nunca se importar em dividir o mínimo que seja em projetos sociais? Por que nunca se lembrar dos esquecidos até que os esquecidos se lembrem deles da forma mais violenta das possíveis?
Acredito que cada um cidadão que tem a oportunidade de estudar, trabalhar, ter um lar, uma família, uma renda, uma fé, dignidade, oportunidade, tem o dever e a missão de mudar o mundo que teremos daqui a rápidos 10 anos.
Lembro-me da história do escritor que repreendeu uma criança que recolhia estrelas do mar em uma praia e as lançava novamente ao mar para que não morressem queimadas pelo sol.
Disse o escritor ao menino: “Menino você não vê que há milhares de quilômetros de praias com milhares de estrelas do mar morrendo queimadas pelo sol diariamente? O que adiantará você salvar apenas algumas?” O menino abaixando-se pegou mais algumas estrelas que estavam presas na areia e com toda a sua força jogou-as no mar, olhou para o escritor e disse: “Para estas fez diferença”. E é esta a lição e a atitude que temos que ter. Se não podemos fazer um grande projeto social que beneficie centenas de crianças, sempre existe uma criança, uma família ao nosso lado que podemos ajudar. Seja com um livro, seja com um presente no aniversário ou no natal, seja com a dica de um curso gratuito existente, seja com a passagem do ônibus para que um pai possa procurar emprego. Enfim, a preocupação de ajudar deve fazer porte da vida de todos. E como disse Ana Carolina na gravação de uma de suas músicas: “Sei que não dá para mudar o começo, mas sei que é possível mudar o final”. E que daqui a 10 anos possamos encontrar um mundo caminhando para uma vida mais igual, uma vida melhor para todos.
Gilberto Horácio